VIDA E OBRA DE NIETZSCHE, POR SUE PRIDEUX
Uma biografia de Nietzsche. Sue Prideux
Premiada
pelas biografias que publicou de August Strindberg e Edvard Munch, a escritora
anglo-norueguesa Sue Prideux apresenta, desta feita, em “Eu sou dinamite! A
vida de Friedrich Nietzsche” (Temas e Debates, 2019), a figura de um dos
pensadores mais marcantes dos últimos dois séculos - com revisão de Nigel
Warburton quanto à descrição apresentada das ideias do filósofo alemão
1.Até
o seu avô tomar ordens sacras e, por essa via também, alcançar uma mobilidade
social ascendente, a família de Nietzsche era muito modesta (em termos
económicos e na hierarquia social). O pai daquele que viria a tornar-se no mais
jovem professor de sempre na universidade de Basileia, Karl Ludwig Nietzsche,
por seu turno, era um pastor luterano - sendo, pois, empregado do Estado, dado
que os pastores eram pagos em dinheiro público -, conservador e monárquico, com
importantes dotes musicais, que cativava uma grande audiência, vinda de zonas
remotas quando disso era caso, para o ouvir ao piano. Karl Ludwig tinha duas
meias-irmãs, era acometido de fortes distúrbios nervosos (aliás, como aquelas),
fechava-se durante horas no seu escritório sem comer, sem beber e sem falar. Aos
35 anos, a sua vida activa termina e, nesse mesmo ano, morrerá de
"amolecimento cerebral" (expressão médica que podia valer para
diferentes doenças ao nível neurológico/cerebral). Já o seu filho, Friedrich
Nietzsche, o filósofo que abalaria o mundo, ficaria louco aos 44 anos e
morreria aos 56. No momento da morte do pai, Nietzsche tinha apenas 4 anos; a
sua irmã, Elisabeth, 3; e o mais novo dos irmãos, 2 - sendo que este último
sucumbiria mortalmente (com esta mesma idade). A mãe de Nietzsche era uma jovem
de 23 anos quando o marido morreu. O pequeno Friedrich viveu os anos de
infância com a mãe, a irmã, a avó e duas tias solteiras.
O encontro com o compositor, aclamado, querido, amparado pelo monarca, estrela internacional Richard Wagner, o encanto e sedução que a música daquele produzia neste, as visitas constantes à residência, do mesmo, na Suíça, marcaram a sua vida. Wagner é o autor mais citado na obra de Nietzsche (mais do que Sócrates ou Jesus de Nazaré). Wagner é "o Mestre", tratado por Professor e, no entanto, sem o conhecimento, sem a frequência académica do latim e do grego, necessitando do imprimatur de Nietzsche. Com efeito, se o fascínio de Nietzsche por Wagner é bem compreensível e natural face a uma das maiores figuras do seu tempo, já o oposto chama a atenção - e esta chancela, de alguém que, aos poucos, iria impor a sua estatura intelectual, é uma das explicações possíveis (para tal aura). Ao longo do convívio com o casal Wagner e Cosima - esta última, filha de Liszt, principia relação com o grande compositor sendo ainda casada - percebe-se um trio não apenas místico, mas, em realidade, dá-se uma relação intensa a três, com as suas insinuações a possuírem algo de eros. Cosima, católica devota, e Wagner, ateu rematado, elogiarão muito A origem da tragédia, de Nietzsche, quando recebem o livro enviado pelo Professor de Filologia, dedicado, e assente no elogio, a Wagner, em cuja música veria a combinação do apolíneo com o dionisíaco. Conquanto um intenso manto de silêncio recobriria a apropriação pública de tal ensaio durante meses, assim que um elogio surge na imprensa, pela pena de um ex-companheiro de escola de Nietzsche, eis que outros, muito críticos e duros, se lhe impõem e colocam em causa a sua reputação (e, nela, registe-se, o número de alunos que se inscrevem nas suas aulas – então, residual), por muito que Wagner tivesse saído em sua defesa (no mesmo periódico). De facto, tratou-se, ainda, de um escrito mal recebido pela comunidade académica por ir contra os cânones estabelecidos pela academia - do ponto de vista formal, antes de mais. Uma obra que é, ainda, e no dizer de Simon Blackburn, que foi Felow e Tutor do Pembroke College de Oxford, e diretor da Mind, importante revista internacional de Filosofia. Edna J. Koury Distinguished Professor of Philosophy na Universidade da Carolina do Norte, em “Dicionário de Filosofia” (Gradiva, 2007, pp.300-301), “um desafio à resignação budista de Schopenhauer”. É que, acrescenta Bertrand Russell, na “História da Filosofia Ocidental” (Companhia Nacional, São Paulo, 1957), a moral oriental da renúncia não parece, efectivamente, casar bem com a omnipotência da vontade (em Nietzsche).
3.Desde
há muito, Nietzsche teme um conflito entre Alemanha e França; este, surge em
finais do século XIX; Nietzsche pede à Universidade de Basileia, na qual
ingressa de modo muito precoce com apenas 24 anos, em 1869 (ali ficará até
1879, altura em que a doença, bem como o desejo da completa dedicação à
filosofia o afastarão da faculdade), para se poder alistar junto aos da sua
pátria, seja como combatente, seja como ajudante de ambulância. É aconselhado a
este último posto pela Universidade, enquanto Cosima, sempre severa e direta ao
assunto, lhe transmite que os homens de Bismarck não precisam de um diletante. Ainda
nem os 15 dias do curso de enfermagem, que se prontificou a tirar, tinham
passado, quando vários doentes e moribundos necessitaram da sua ajuda. Após
muito auxílio a combatentes feridos, seria o próprio a cair doente, correndo
risco de vida. Sendo-lhe dado e receitado ópio e ácido tânico, destruíram-lhe
os intestinos para sempre - eis a medicina da época. Nietzsche, um bom
cavaleiro, regressa da guerra um europeísta convicto, horrorizado com o
tratamento que os homens de Bismarck darão aos franceses em Paris, fazendo-os,
nomeadamente, morrer à fome. Nisto, se afastará de Wagner, que manterá, ou
aumentará porventura, um nacionalismo (alemão) exaltado (mas apenas quando
descobre, vários anos depois, a correspondência entre Wagner e o médico que
este lhe aconselhara, Dr. Eiser, em que o primeiro, face aos problemas
inultrapassáveis de visão de Nietzsche, atribui o facto, atentos os padrões e
mentalidade da época, à masturbação, Nietzsche entra em ruptura com o compositor
- sendo que estes factos só foram conhecidos em 1981; de acordo com Simon
Blackburn, porém, a última das “Considerações Intempestivas” assinala a ruptura
entre aquelas destacadas personalidades, que se deu em parte, igualmente,
devido ao nacionalismo e antissemitismo do segundo, pelo demasiado cristão
“Parsifal” daquele, e em parte, em sentido inverso, porque Wagner não apreciava
a atracção do próprio Nietzsche pelo iluminismo francês).
4.Nietzsche,
aos 27 anos, solteiro, é "muito procurado e cortejado" (p.111). O
tema do seu (esperado/desejado/exigido) casamento é uma constante em sua mãe
(ainda que nunca chegue a realizar-se). Mas também se torna presente no casal
Wagner-Cosima (casal que pensará em Nietzsche como o preceptor ideal para o
filho de ambos). Pelos 30, decide declarar-se a Mathilde. Nietzsche, o homem
que ambicionava ser "um rebelde insaciável, que não se preocupasse com a
própria segurança nem com a segurança do mundo, um inovador cultural cujo
pensamento desencadeasse grandes terramotos conceptuais"(p.179), um génio
com "erupções visionárias (...) essenciais para salvar a humanidade da
estagnação e da mediocridade" (p.179), vira dois dos seus mais íntimos de
juventude dedicarem-se, num dos casos, ao sacerdócio católico (o que o
escandaliza) e, noutro, ao casamento, ficará sem essa devoção, ele que, por
outro lado, e um pouco contra a corrente em sua época, sempre valorizara
mulheres inteligentes, com elas mantinha fortes ligações e amizades, e havia
estimulado sua irmã Elisabeth, que era "esperta e inteligente", a
conhecer mais, a alargar os horizontes com que se confrontava (irmã que nunca,
em qualquer caso, compreendeu a sua obra). A irmã preferiu manter-se sem
responsabilidades, em consonância com o “estatuto” dado às mulheres naquele
tempo. Em Basileia, onde a tradição de conferências públicas está muito
enraizada, Nietzsche fica responsável por 6 de 40 palestras a ocorrer ali. Logo
na primeira, consegue uma audiência de 300 pessoas; em realidade, as suas
conferências serão populares (mas não as conclui, porém, devido a doença). A
Universidade vai-lhe aumentando o pecúlio (de 500 para 3500 francos e, mais
tarde, 4000), Nietzsche recusa outra cátedra de Filologia, em Universidade
diversa da de Basileia, porque o que mais estima é dedicar-se à Filosofia.
Nietzsche não terá, pois, uma preparação académica específica em Filosofia (ao
nível universitário), nem nunca dará aulas de Filosofia. Quando, na
Universidade em que lecciona, vaga Cátedra de Filosofia será alguém com
formação na área a ocupá-la para desgosto, e ingenuidade em ter suposto o
contrário, de Nietzsche. Em qualquer caso, a sua crescente influência só seria
travada pelos artigos que arremeteram com violência - "o bilhete de
suicídio de um filólogo", escreveu-se - contra o seu livro “A origem da
tragédia” (sendo que, e do mesmo modo, composições que escreveu, ele que tocava
piano, não foram apreciadas).
A avó morre quando Nietzsche tem 11 anos e, aos 12, impõe-se-lhe uma visão de Deus, guiando-o a dedicar-lhe toda a sua vida (p.37). A Matemática entediava-o, os resultados nesta área não eram famosos e o seu professor queria, inclusive, recusar-lhe o Abitur por não se ter dedicado nas férias à disciplina; todavia, os demais docentes demoveram o homem da Aritmética (de assim agir), considerando que estavam perante o melhor aluno que alguma vez havia frequentado aquela instituição de ensino. Numa época em que a Grécia Antiga havia sido ressuscitada pelo romantismo alemão, e com as Escrituras a terem um papel destacado na Cultura, Nietzsche, no seu Secundário, ficou a saber muito bem latim, grego - de resto, nesta escola os rapazes eram estimulados a falarem entre si em tais idiomas - e, com mais dificuldades, o hebraico. Nunca dominaria o Inglês, o que o obrigou a ler Shakespeare (exclusivamente) em alemão. Neste colégio, a alvorada era dada às quatro da manhã (num dormitório de 30 rapazes) e um amplo currículo era percorrido até às 20h, desde as 5h da manhã, com uma mistura de Atenas e Esparta (no núcleo de estudos/práticas; a natação seria um prazer recreativo de toda a vida de Nietzsche). Aos 17 anos, Nietzsche escreverá Euphorion, uma espécie de novela pornográfica. Uma certa militarização de uma juventude engendrada, em uma espécie de Fraternidade que Nietzsche encontrará no seu primeiro ano de faculdade, na Frankonia, tempo de libertação e de certa perdição (pode ter contraído sífilis numa casa nocturna), onde o aproveitamento não foi o melhor. Mudando um dos seus predilectos Professores de Filologia, para uma outra Universidade, acompanharia o movimento e por este seria mesmo indicado para Professor à Universidade de Basileia, que lhe daria um Doutoramento sem realizar um exame. De acordo com Giulliano Campioni, Professor de Filosofia na universidade de Pisa, mau grado a Filologia não ser o destino de Friedrich, “Nietzsche marca a história dos estudos clássicos com um contributo significativo, nomeadamente pelos seus trabalhos sobre Diógenes Laércio e Teógnis” (in Jean-François Pradeau (org.), “História da Filosofia”, D. Quixote, 2010, p.473). Em Basileia, Nietzsche conhece o grande historiador do Renascimento, Jacob Burckhardt, e duas outras figuras que foram influentes no seu pensamento, o teólogo Franz Overbeck e um filósofo russo chamado Afrikan Spir.
Em miúdo, as trovoadas causavam a
Nietzsche a maior impressão e aumentavam o seu "temor do Senhor" e
foi sob o signo daquelas que os seus contemporâneos lhe viam "as explosões
mais inspiradas e extáticas de criatividade e improvisação musical"
(p.225). No momento da Confirmação (Crisma), o seu fervor religioso era,
ainda, muito grande. Autores como Emerson (tal como este, Nietzsche ocupa-se do
problema do livre-arbítrio: "a liberdade de vontade absoluta tornaria o
homem um deus; o princípio fatalista transformá-lo-ia num autómato",
p.49), Holderlin e Empédocles seriam essenciais nos seus questionamentos e
dúvidas (trabalharia sobre Holderlin, motu
próprio, em termos escolares, autor não muito bem-vindo: "Oh, vós,
miseráveis que sentis tudo isto, que, tal como eu, não podeis permitir-vos
falar no homem como estando aqui com uma finalidade, que, tal como eu, estais
tão totalmente dominados pelo Nada que nos governa, tão profundamente
conscientes de que nascemos para nada, de que amamos um nada, de que não
acreditamos em nada, nos esgotamos a trabalhar até à morte por nada só para que
pouco a pouco possamos transformar-nos em nada - como posso evitar que os
vossos joelhos se vão abaixo quando pensardes seriamente nisso? Muitas vezes,
também eu mergulhei nesses pensamentos sem fundo e gritei: Porque encostas o
machado à minha raiz, espírito impiedoso? - e ainda aqui estou", poema Hyperion, p.50), nomeadamente relativas
ao Divino (nesta altura, dirá que a "totalidade do cristianismo" se
baseia "em pressuposições: a existência de Deus, a imortalidade, a
autoridade bíblica, a inspiração e outras doutrinas que serão sempre
problemáticas" (p.49). Muitos anos mais tarde, na recensão a “Para Além do
Bem e do Mal”, uma obra já de maturidade, J.V.Widmann chamar-lhe-á dinamite (e,
talvez, de aí a afirmação "Não sou um homem, sou dinamite", no
capítulo «Porque sou uma fatalidade», em “Ecce Homo”, que dará o título da
biografia de Sue Prideaux que aqui seguimos - “Eu sou dinamite! A vida de
Friedrich Nietzsche”, Temas e Debates, 2019). Dinamite às convenções sociais,
aos pressupostos, ao mundo da vida em
que se assentava, à moral judaico-cristã. Nietzsche é, com efeito, no dizer de
A.C. Grayling, “o paradigma do pensador fulgurante, chocando deliberadamente
quem o encontra, provocando ora o ultraje, ora outra maneira de pensar” (“Uma
história da Filosofia”, Edições 70, 2020, p.365).
Nietzsche é um homem com uma extraordinária capacidade de trabalho; gasta bastante dinheiro em roupa para parecer mais velho do que aquilo que é, quando vai dar aulas para Basileia; a solicitação da Universidade, requer nacionalidade helvética, ao mesmo tempo que se desvincula da alemã; ficará e morrerá apátrida.
6.Além
do Rei, o único com direito a quarto em Tribschen (perto de Lucerna),
residência Suíça onde se encontra Wagner, a qual visitará 23 vezes, é Nietzsche.
Mais tarde, visitará, de modo sistemático Bayreuth (na região da Baviera e
cidade, naquele momento, com cerca de 20 mil habitantes; para a estreia de uma
nova ópera de Wagner e o festival que ali passará a ter lugar, viriam
personalidades como D. Pedro II, Imperador do Brasil, p.ex.), onde se erguerá
um extraordinário edifício para Wagner concluir o seu ‘Anel’ e aí estrear a
ópera e fazer um Festival. Nessa altura, as relações entre Nietzsche e o “Mestre”
irão tornar-se bem mais frias. Nietzsche, o homem que contemplará o mar, pela
primeira vez, em Génova (cidade na qual assistirá, em estreia pessoal, à ópera “Carmen”;
até morrer, verá esta mesma ópera vinte vezes; substituindo, assim, a sua
anterior obsessão por “Tristão e Isolda”), verá Wagner como um tirano, a sua
música como causa da sua doença; tratava-se, afinal, o compositor, pensa
Nietzsche agora, de um histrião romântico, um manipulador sensual.
Para este pensador há, contudo, um lenitivo à dor que temos de aceitar ao abraçar a vida e vivê-la com verdade e coragem, e o lenitivo – como Schopenhauer também defendera – é a arte: “Temos arte”, afirma Nietzsche, “para não perecermos da verdade”; "a arte é a tarefa suprema, a actividade verdadeiramente metafísica nesta vida”, p.450)
Em viagem a Roma, por indicação de Malwida e Paul Rée, encontra uma bela jovem intelectual, Lou Salomé, dezasseis anos mais nova, a quem pede em casamento. Esta declina, afirmando-se renitente em relação aquela instituição. Mas caminha na montanha - no Monte Sacro, em profunda comunhão - com o professor de Filologia, abordando a perda precoce da fé cristã por parte de ambos. E, crendo ter encontrado uma discípula à altura, Nietzsche pretende ir estudar para a Sorbonne e, aí, validar a sua tese do “eterno retorno”. Embora muitos dos seus escritos contenham elementos misóginos, reitera-se que, neste instante, revela uma compreensão da psicologia feminina notável para a época (p.246). A relação com Lou Salomé é intensa. Numa altura em que está a escrever "A Gaia Ciência" onde, pela primeira vez, elabora acerca da questão da chamada "morte de Deus" (ainda que, em rigor e por natureza, Deus seja eterno e o que pode decair, em um dado momento, é uma dada humana representação Dele, uma imagem, um ídolo), passa três semanas em Tautenburg com Lou, com esta a anotar que durante aquele período de nada mais falaram a não ser de Deus: "chegou à conclusão de que Nietzsche era ainda mais religioso por ser ateu e era a dor desse facto que impelia a sua filosofia. Todo o seu desenvolvimento intelectual decorria da sua perda da crença e das suas emoções coincidentes com a morte de Deus. A impossibilidade de encontrar uma substituição qualquer do deus perdido obcecava-o"(pp.266-267). Anselmo Borges recorda o filósofo Eusebi Colomer e, com este, diversas acepções que a expressão “morte de Deus” pode recobrir: “pode significar que Deus realmente nunca existiu, embora só recentemente tenhamos feito essa descoberta. Pode querer dizer que talvez Deus exista, mas os seres humanos, que outrora se lhe dirigiram pela fé e pela invocação, hoje já não acreditam nele. Talvez queiramos apenas exprimir a experiência de ausência e aparente silêncio de Deus, própria do nosso tempo. Talvez estejamos apenas a referir-nos à necessidade de transcender constantemente as nossas ideias acerca de Deus, e, neste sentido, a "morte de Deus" significa a morte dos ídolos fabricados por nós. Afinal, que Deus era esse que morreu? Se o Deus verdadeiro é o Deus sempre maior, que transcende sempre tudo quanto possamos pensar ou afirmar dele, então os deuses enquanto ídolos têm de morrer, para ser possível a fé no Deus verdadeiro... Neste domínio, a pergunta essencial consiste em saber se é possível ser Homem sem colocar honestamente a questão de Deus. É que ser Homem é a abertura ao Infinito, e, assim, a questão do Homem é a questão de Deus precisamente enquanto questão (…) De facto, como disse Marion Gräfin Dönhoff, co-editora do conhecido semanário alemão Die Zeit, "o fixar-se exclusivamente no aquém, que corta o Homem das suas fontes metafísicas, e o positivismo total, que se ocupa apenas com a superfície das coisas, não podem dar aos seres humanos um sentido duradouro e estável, e, por isso, levam à frustração”” (“Deus morreu? Testemunhos”, DN, 14-08-2021).
Para João Manuel Duque, Prémio Árvore
da Vida 2021, ler Nietzsche enquanto filósofo, é lê-lo a partir da leitura que
dele fez Martin Heidegger. E, a propósito da temática da “morte de Deus”, a
“primeira questão básica (…) pode ser colocada com J.L. Marion, em toda a sua
pertinência: qual o Homem que constata a morte de Deus? Aquele que o pretende
ver, que o procura (como o insensato [de A gaia ciência]). Princípio básico
nietzscheano, face a essa procura: “Ninguém pode ver a Deus, sem que ele
morra…Porque o Deus não apresenta, no naos do templo, a sua esfinge, a não ser
dissimulando-a na semi-obscuridade de uma dúvida, de uma imaginação e de um
sonho”. E aqui começa o conceito idolátrico de Deus, de quem Nietzsche proclama
o ‘crepúsculo’” (“Dizer Deus na pós-modernidade”, 2003, pp.23-24).
Quem, igualmente, se tem detido sobre a fala do insensato ou louco de “A gaia ciência” é o também teólogo católico Tomás Halík que nos diz que desde que feita, tal proclamação, na obra de Nietzsche, captou, profundamente, a imaginação (como que uma obsessão) dos homens que se lhe seguiram (já agora, podemos ver a interpretação do louco de “A gaia ciência”, por exemplo, no colossal “O cavalo de Turim”, do realizador húngaro Béla Tarr, em que, justamente, Nietzsche - do título da película ao início da mesma de modo direto, e ao longo de todo filme - paira com inegável densidade):
“Não ouviram falar do louco que acendia uma lanterna em pleno dia e desatava a correr pela praça pública gritando sem cessar: «Procuro Deus! Procuro Deus!» Mas como havia ali muitos dos que não acreditam em Deus, o seu grito provocou grande riso. «Ter-se-á perdido como uma criança», dizia um. «Estará escondido? Terá medo de nós? Terá embarcado? Terá emigrado?» Assim gritavam e riam todos ao mesmo tempo. O louco saltou no meio deles e trespassou-os todos com o olhar. «Para onde foi Deus?», exclamou, «é o que lhes vou dizer: «Matámo-lo…vocês e eu! Somos nós, nós todos, que somos os seus assassinos! Mas como fizemos isso? Como conseguimos esvaziar o mar? Quem nos deu uma esponja para apagar o horizonte inteiro? Que fizemos quando desligamos a corrente que ligava esta terra ao sol? Para onde vai ela agora? Para onde vamos nós próprios? Longe de todos os sóis? Não estaremos constantemente a cair? Para diante, para trás, para o lado, para todos os lados? Haverá ainda um acima, um abaixo? Não andaremos errando através de um vazio infinito? Não sentiremos na face o sopro do vazio? Não fará mais frio? Não aparecem sempre noites, cada vez mais noites? Não será preciso acender os candeeiros logo pela manhã?”.
Ora, Halík, como vimos de dizer, tem-se
dedicado, de modo sistemático, à busca da dilucidação daquela expressão. Por
exemplo, em “O abandono de Deus. Quando a crença e a descrença se abraçam”,
Paulinas, 2017, pp.24-28, afirma: “Quando encontro um homem que afirma não
acreditar em Deus, apresento-lhe sempre a questão: que Deus é esse em que não
acreditas? Que é que te leva a não crer nele? E consegues representar e
especificar sob o conceito «Deus» ainda algo de diferente daquilo que negas? «Deus
morreu! Deus está morto», afirma o louco em A
gaia ciência. Todavia, numa outra passagem, Nietzsche indica que a morte de
Deus, finalmente, não é definitiva: talvez o voltemos a ver, talvez Ele «tenha
despido apenas a sua pele moral». Talvez surja, de novo, um deus no qual o
louco de A gaia ciência, o sábio
Zaratustra e também o próprio Nietzsche (tratar-se-á de um só ser em três
pessoas?) poderiam começar a acreditar: um deus que saberia dançar; um deus que
constituiria um contraste com o «espírito de pesadume», com o «espírito de
vingança». Talvez Nietzsche, este louco sábio e este sábio louco, «o mais
piedoso entre os descrentes», busque, após a morte do deus antigo, um deus
assim, que já não acorrenta, mas liberta, que solta o homem para a coragem,
para a força criadora e para a responsabilidade? (...) Ateísmo não significa a
«irreligiosidade» na acepção de uma recusa de Deus, mas da rejeição de um
determinado tipo de teísmo, de uma determinada representação de Deus. Cada
ateísmo refere-se a um determinado tipo de teísmo (...) [e] há muitas espécies
de teísmo que são mais obstáculo do que um apoio para as pessoas no seu caminho
para o mistério que chamamos Deus (...). Começar a crer não significa poder
apoiar-se em pilares de certezas, mas entrar na nuvem do mistério e aceitar o
desafio: mergulha fundo! (...) Goethe divisava na luta da fé com a
incredulidade a essência de toda a história. Acrescentemos ainda que esta luta
se trava, muitas vezes, no íntimo de um homem (...) O mundo e a vida são
ambivalentes e polifacetados. «Há luz bastante para os que querem ver e treva
suficiente para os que têm uma disposição contrária», escreveu Pascal.” No seu
mais recente “As igrejas vazias” (Paulinas, 2021), sobre o período textual “cem
mil vezes lido e refletido e ainda menos compreendido”, dirá: “Nietzsche
descreve um homem louco (Der tolle Mensch),
um tolo, isto é, o único que pode dizer a verdade, que vai ao meio-dia ao
mercado com uma lanterna acesa (fazendo alusão ao filósofo Diógenes) e procura
Deus – e as pessoas riem-se dele. Mas o principal que é dito no texto, e que
muitos não se dão conta, é a frase de Nietzsche, que ele veio entre as pessoas
que não acreditavam em Deus. Com a sua mensagem de que Deus está morto e fomos
nós que o matámos, Nietzsche, com a máscara do seu louco, não provoca apenas os
crentes, mas, em primeiro lugar, os ateus que não acreditavam em Deus e já não
queriam procurá-lo. Nietzsche provoca aqueles que não procuram Deus (…). O
homem louco descreve dramaticamente o que significa o desaparecimento de Deus,
o assassínio oculto de Deus que ninguém mais procura. Apenas no final do
capítulo, após ter desafiado os ateus indiferentes vai procurar também os
crentes indiferentes que tampouco procuram Deus, uma vez que se consideram
donos de Deus, seus representantes e intérpretes. No templo deles, o homem
louco canta um Requiem, um cântico fúnebre para o Deus morto. E quando o trazem
para fora, pergunta: o que são esses templos além de túmulos e tumbas de Deus?
Sim, uma certa representação de Deus, que era uma projecção de sonhos e medos e
refletia as condições de uma determinada época, está morta, embora alguns
cristãos tentem obstinadamente ressuscitá-la. Deixemos os mortos enterrar os
seus mortos, diz Jesus. Certamente, isso aplica-se também aos deuses mortos de
uma fé morta” (p.65).
Anselmo Borges, no seu mais recente
livro, “O mundo e a Igreja. Que futuro?” (Gradiva, 2021, pp.140-141), assinala
que Nietzsche viverá atenazado entre o Deus que tem de morrer para ser possível
o super-homem e a permanente nostalgia do Deus desconhecido. Foi ao Deus
desconhecido que Nietzsche dirigiu esta oração: «Antes de prosseguir no meu
caminho e lançar o meu olhar para a frente uma vez mais, elevo, só, as minhas
mãos para ti, na direcção de quem eu vou. A ti, das profundezas do meu coração,
tenho dedicado altares festivos para que, em cada momento, a tua voz me pudesse
chamar. Sobre esses altares estão gravadas em fogo estas palavras: ‘Ao Deus
desconhecido’. Eu sou teu, embora até ao presente me tenha associado aos
sacrílegos. Eu sou teu, não obstante os laços que me puxam para o abismo. Mesmo
querendo fugir, sinto-me forçado a servir-te. Eu quero conhecer-te,
Desconhecido. Tu, que me penetras a alma e, qual turbilhão, invades a minha
vida. Tu, o incompreensível, mas meu semelhante, quero conhecer-te, só a ti
quero servir».
Nietzsche, regista Anselmo Borges,
“havia de confessar a Ida, a mulher do seu grande amigo F. Overbeck: «nunca
abandones a ideia de Deus. Eu abandonei-a; quero criar algo de novo, e não
posso nem quero voltar atrás. Acabarei por sucumbir a esta paixão que me
consomo constantemente. Vou-me desmoronando». Conclui o professor de Filosofia:
“se tudo caminha para o nada e se afunda no nada, já tudo é nada. E o que é que
verdadeiramente vale?”.
Como nota o atual bispo de Lamego, António Couto, em “Do lado de cá da meia-noite” (Paulus, 2021), Emmanuel Levinas escreveu que «a história da filosofia Ocidental foi uma destruição da transcendência» e o professor de História Moderna, Jacob Leib Talmon afiançou que «na história da humanidade, não se consegue encontrar uma revolução de tão vasto alcance como a perda da fé numa Providência que vela sobre os homens e sobre a sociedade, e a guia para uma solução racional e salvífica». Para o prelado, tal situação radica na colocação da consciência, de modo absoluto, como fonte e fundamento da própria verdade e liberdade do humano separada de todo e qualquer princípio exterior a ela. Ora, fundamental era que o “bom-dia” procedesse o “cogito”, os rostos nus (concretos) primassem sobre os valores (genéricos e abstractos), os santos, os justos, as pessoas boas, mais do que a santidade, a justiça ou a bondade. Num mundo hermeticamente cerrado sobre o eu, impõe-se reabilitar a alteridade, a heteronomia, a exterioridade e a socialidade. Numa palavra, o diagnóstico é bem claro – “sociedade anónima, desencantada, «sem Deus e sem profetas» (Max Weber), anestesiada, desinfectada, medicada, não apenas vazia, mas esvaziada” – e a cura urgente – “quem quiser levantar esta sociedade desencantada, anestesiada, desinfectada, medicada, esvaziada, dependurada, tem primeiro de lhe restituir tudo o que lhe roubou: Deus, a Providência, a alma, os pais, os filhos, os netos, o chão, o céu, a casa, o sonho, as canções, o amor, a emoção, a comoção, a história, as histórias, a tradição, o rosto, o rosto do outro, a heteronomia, a exterioridade, a socialidade, a responsabilidade pelo outro” (pp.23-24 e 45).
Nietzsche quis cortar as relações com a
família, dela se emancipar. Há cartas, por si redigidas, em que o tema do ópio
e do suicídio surgem. Fora do livro (“Assim falava Zaratustra”), Nietzsche, o
«filósofo do talvez», falava de Zaratustra como seu filho. A certo momento, o
editor de Nietzsche, Schmeitzner, recusa-se a editar mais livros deste. Tinha
editado 13, em edições de 1000 exemplares, e nunca tinha ganho dinheiro com
estes. Os Zaratustra já publicados tinham vendido menos de 100 exemplares. Além
disso, o editor assinava uma gazeta anti-semita, o que o afastará ainda mais de
Nietzsche - um cidadão a quem o Segundo Reich sempre causara horror. “Assim
falava Zaratustra” não trouxe a Nietzsche - homem que defendeu a contemplação:
"as pessoas activas rolam como uma pedra, submetendo-se à estupidez da
mecânica (...) Os homens pertencem a dois grupos: os escravos e os homens
livres. Aquele que não dispõe de dois terços do seu dia para si próprio é um
escravo, independentemente do que possa ser - estadista, homem de negócios,
funcionário ou intelectual" (pp.451-452) - qualquer reconhecimento em vida.
O ensaísta iria editar as suas obras em edições de autor.
A
irmã Elisabeth, sobre a qual se escreverá um panfleto (de Samuel Roth) medíocre
quanto a uma relação excessivamente íntima com o irmão, de quem Nietzsche
chegará a dizer tratar-se de uma "parva vingativa e anti-semita", casar-se-á
com o anti-semita (e vegetariano ferrenho) Forster, que tinha uma missão, criar
colónias alemãs, no Paraguai, e ambos pedirão a Nietzsche, que se recusa a ir
ao casamento, como prenda, a gravura de Durer, “O cavaleiro, a Morte e o Diabo”,
de 1513, que este possui. Nietzsche acede ao pedido. Tal como terá sido o
responsável do mármore, e seus dizeres religiosos perfeitamente ortodoxos, da
campa do pai. Encontrou-se uma única vez com seu cunhado, por altura do seu 41º
aniversário, visitando, então, a mãe Franziska, quase iletrada e sem contactos
influentes, e a irmã Elisabeth.
9.Este homem cortês, voz baixa, com uma
dieta austera à base de chá, ovos e carne, por vezes limitando-se a comer fruta
e beber leite, que procurava os lugares mais baratos para se alimentar, buscou,
nos anos seguintes, ir ainda mais fundo, dentro de si, à procura das grandes
verdades existenciais. Considerava que manter-se o código da moral
judaico-cristã, apesar da sociedade já não acreditar na religião em si, era
viver na hipocrisia e na mentira, como "cristãos de três quartos"
(p.321). Entendia que, inicialmente, o homem era livre, mas emparedara-se em
crenças, desde os observatórios zoroastrianos, ou os templos gregos e romanos.
"O homem não consegue viver sem essas inverdades. Não consegue suportar a
vida sem medir a realidade por meio de sistemas ficcionais inventados"
(p.322). Na genealogia da moral, encontramos Platão, que nos saturou com a
ideia de verdade absoluta, com a sua teoria da forma, a distinção entre verdade
e aparência. Quanto à ciência, diz Nietzsche, não é melhor. Está a procurar
substituir-se à religião, confundindo-se, assinala, no mundo moderno a teoria
científica com o dogma moral. Mas, afinal, o que foi explicado com a Física? "Apenas
aquilo que pode ser visto e sentido", o que, pelos vistos chega, numa
"época com um gosto basicamente plebeu". Só que ser humano não é
apenas isso, viver naturalmente: "viver - não é especificamente ser algo
diferente desta natureza? Viver não é avaliar, preferir, ser injusto, ser
limitado, querer ser diferente?" (p.324).
De acordo com A.C.Grayling (aliás, em linha, por exemplo, com o Bertrand Russell de “A História da Filosofia Ocidental”), Master na New College of the Humanities e Supernumerary Fellow da St. Annes’s College, de Oxford, não devemos perder de vista que “o interesse principal de Nietzsche era a ética e, em grande parte, como esta era entendida pelos filósofos da Antiguidade, nomeadamente como uma resposta às perguntas: “que género de pessoa devo eu ser?”, “como devo viver?”, “que valores devem configurar e guiar as minhas escolhas e objectivos, a minha vida?”” (p.368).
10. O inventário dos seus bens
terrestres, em 1887, resumia-se a algumas camisas, calças, dois casacos,
chinelos e sapatos, artigos de barbear e escrita, o fundo de um clube e uma
caçarola (p.320). Com a idade, a sua caligrafia, em função do estado (muito
precário) da sua visão, só era decifrável pelos muito próximos, isto é, por
aqueles que conheciam os seus pensamentos. Entretanto, o maior crítico
literário da Europa Setentrional, um dinamarquês, Georg Brandes, um homem que
defendera e elogiara Dostoievski ou Kierkegaard, muito contestado pelo clero,
envia a Nietzsche uma carta entusiástica a propósito dos seus livros. Deu
conferências na Universidade de Copenhaga sobre Nietzsche - "o radicalismo
aristocrático". Note-se que também Dostoievski e os seus livros exercem
sobre Nietzsche um considerável fascínio, interesse, reconhecimento. Os olhos
de Nietzsche, aliás, ficavam em lágrimas quando se falava de “Recordações da
Casa dos Mortos”. O filósofo alemão, olhando para o passado, descrevia-se como
uma criança estranha (um seu companheiro de lides académicas tratava-o como o
único habitante de um país que só ele frequentava). Turim, Nice, Suíça,
regresso a Turim, diferentes estâncias em busca de saúde e de inspiração. Em “Anticristo”
(sendo que Antichrist pode significar
«Anticristo» ou «anticristão») critica a religião cristã e a sua desvalorização
da vida na terra, mas deixa claro que as condenações estão reservadas à Igreja
e à religião e não a Jesus Cristo, que admira e venera. Paulo seria recriminado
como autor do ressentimento, contrário ao espírito do fundador. Vários livros
de Nietzsche, o Argonauta do Espírito, o homem que vem reinar depois da
"morte de Deus", foram proibidos na Rússia por causa dos seus ataques
ao cristianismo (proibição levantada em 1906). No pontuar do pensamento de
Nietzsche, Anthony Kenny, que foi Presidente da Academia Britânica e
Pró-Vice-Reitor da Universidade de Oxford, em “Nova História da Filosofia
Ocidental – Volume 4” (Gradiva, 2010), nota que quando Nietzsche proclama a
«morte de Deus» “não o fez num tom de filósofo, mas no de evangelista; não
apresentou argumentos contra uma tese, antes proclamou a maior das boas-noas”
(p.333), e sintetiza o pensamento daquele: “o cristianismo é, diz Nietzsche, um
sistema, uma visão coerente e completa das coisas. Se se quebra um dos seus
conceitos principais, a crença em Deus, faz-se tremer todo o edifício; fica-se
sem nada de essencial nas mãos. O cristianismo pressupõe que o homem não sabe –
que não pode saber – o que é bom e o que é mau para si: acredita em Deus e só
Deus sabe essas coisas. A moral cristã é um imperativo; a sua origem é
transcendental; está para além de qualquer crítica, de qualquer direito de criticar;
só é verdadeira se Deus for verdadeiro – sustém-se ou desmorona-se com a crença
em Deus. A ideia de lei moral sem legislador é vácua”. Em A gaia ciência, regista Kenny, Nietzsche “denunciou a abnegação
cristã, a ética altruísta, a política democrática e o positivismo científico
como elementos hostis à vida” (pp.46-47). Em “Para além do bem e do mal” (1886)
e “A genealogia da moral” (1887) contrapõe “a moral do senhor, aristocrática,
que valoriza sobremaneira a nobreza, a coragem e a sinceridade, à moral do
escravo, ou moral do rebanho, que valoriza características submissas, como a
humildade, a compaixão e a benevolência” (p.48). Para Nietzsche, a muito cristã
“solicitude sistemática para com os fracos diminui a saúde geral e a força da
humanidade”.
Durante a década de 1890 houve um interesse por Nietzsche na Rússia que não era igualado em nenhum país da Europa, a julgar pelo número de obras que se publicaram nesse período sobre a obra do filósofo (p.373). A sua fórmula para a grandeza humana é amor fati, não querer que nada seja diferente, nem para a frente nem para trás, nem por toda a eternidade. Nunca acredites numa ideia que te ocorra dentro de casa, eis outra das suas máximas, ele que entende as montanhas e os lagos como lugares inspiradores. E considera que "quase em toda a parte foi a loucura que preparou o caminho para a ideia nova" (p.227).
11.Demora
três semanas a escrever “Ecce Homo”, só, em Turim ("para viver sozinho, há
que ser um animal ou um deus, diz Aristóteles. Mas é possível ser ambos - um
filósofo", p.453). Ali, onde se deslocava geralmente à Piazza Carlo
Alberto e se dirigia à livraria na qual passava horas sentado a ler, com o
livro muito perto do rosto, sem nunca efectuar uma compra. Por aquela zona da
cidade, a 3 de Janeiro de 1889, Nietzsche, ao que consta, ao ver o cocheiro de
uma tipoia bater impiedosamente no seu cavalo, foi-se abaixo e, dominado pela
compaixão, abraçou-se ao pescoço do cavalo e desfaleceu. Durante os dias
seguintes, no seu quarto, teria comportamentos delirantes, gritava, cantava aos
berros, dava murros, andava nu em danças dionisíacas...Foi acompanhado com
astúcia e levado, sem que Nietzsche soubesse da real motivação da viagem que
empreendia, a um manicómio em Basileia. A 14 de Janeiro, a sua mãe visita-o nesse
local. Foi transferido para a clínica homologa em Jena, mais próxima da casa
natal. Ernst Mahly, jovem médico, ex-aluno de Nietzsche em Basileia, foi o
escolta escolhido para esta mudança. Anos depois, suicidar-se-á, e o seu pai
atribuirá a responsabilidade do sucedido a Nietzsche. Nietzsche, cujos cadernos
de apontamentos eram escritos e escritos até estarem completamente cheios - um
hábito de um homem sem posses económicas - e que juntava coisas de suma
importância a listas de compras, esteve 14 meses na clínica Jena.
Posteriormente, daria passeios com sua mãe, querendo sempre bater em cães ou
nas pessoas pelas quais passava. Foi concedida a Franziska a custódia do filho,
em 1890; esta, alugara um apartamento em Jena; certo dia, Nietzsche, fugiu. Um polícia
deu com ele, a mãe levou-o para a casa natal.
12.Entretanto,
no Paraguai, o marido de Elisabeth suicida-se (num contexto de grave crise de
finanças pessoais, de reputação manchada e em vias de perderem a colónia por
falta de pagamento ao governo paraguaio). Elisabeth regressa à Alemanha em
Dezembro de 1890, para tratar de assuntos da colónia, mas daí a nada estará de
novo naquele país sul-americano com muitas críticas dos colonos ao seu
autoritarismo e megalomania. Definitivamente, a irmã de Nietzsche encontrar-se-á
em casa em 1893. Estamos num tempo em que “Crime e Castigo” causara uma grande
impressão na primeira geração desesperada pós-cristã ("as almas
naufragadas que procuravam desesperadamente a resolução entre o cepticismo e o
anseio de paz e que constituíam essa geração agarraram-se à retirada do
significado, operada por Nietzsche, da sua posição ilusória no exterior da
vida, colocando-o de novo na própria vida (...) Nietzsche criara para eles a
possibilidade de o significado ser algo totalmente pessoal", p.415). Uma
série de homicídios entre estudantes seria conhecida como "efeito
Raskolnikov" (nome do anti-herói do livro de Dostoievski).
13.O “Ubermensch” [super-homem, homem
superior] de Nietzsche reclama o combate, não necessariamente contra terceiros,
mas contra as emoções mesquinhas de cada um, como a inveja e o ressentimento. A
geração alemã instruída, entre os 20 e os 30 anos, passa toda pela leitura do
professor de Filologia e a este deve a sua cosmovisão; em 1893, a obra de
Nietzsche espalha-se entre a vanguarda artística tanto de Berlim (por exemplo,
o círculo boémio «Leitão preto», de Strindberg, mas também de Edward Munch; o
primeiro apresenta a obra de Nietzsche ao segundo que fica tão impressionado
que pintou “O grito” que captou, como nenhuma outra obra, o Zeitgeist: Munch produzia o símbolo
definitivo do terror existencial ao contemplar as consequências da chamada “morte
de Deus”) como de Paris, "com amplos efeitos na pintura, na dramaturgia,
na poesia e na música" (p.418). Strindberg escreve a peça “Menina Júlia”,
que passa a ser a mais proibida na Europa e nos EUA (nisso substituindo “Gengagere
– Espectros” - de Ibsen). Lou Salomé também contribuiu para a notoriedade de Nietzsche
- pensador segundo o qual "quem pensa muito não possui as características
necessárias para se tornar um homem de partido. O seu pensamento atravessa o
partido e não tarda a ultrapassá-lo", p.457 - com vários textos em
revistas e um primeiro estudo importante da vida e obra daquele. A forma
aforística, curta, de comunicação de Nietzsche - que regista que "Deus
morreu, mas a sombra da moral que ele transmitiu manter-se-á durante mil
anos" (p.257) e questiona "o que é o homem? Um híbrido entre planta e
fantasma. O que é o super-homem? É o significado da terra que permanece fiel à
terra" (p.278) - também estava, por sua vez, a ter um impacto imediato nas
artes da década de 1890. As peças de Strindberg abandonam as unidades teatrais
clássicas de tempo, espaço e acção e acabam por ser incompreensíveis porque não
seguem uma acção lógica. Munch deixa zonas inteiras de tela nuas e por pintar,
Nietzsche tinha deixado reticências para o leitor completar, afirmando a humana
impossibilidade da verdade objectiva.
Em 1894, as obras de Nietzsche estão, finalmente, a vender-se. O seu autor já só consegue reconhecer a mãe, a irmã e Alwine. As relações mãe-filha tornaram-se insustentáveis. Elisabeth vai escrever uma biografia, falseada, do irmão. Vai ficar a tutelar o seu espólio literário. A mãe morre, infeliz e esgotada, em 1897, com 71 anos. Elisabeth controla, agora, o homem e a obra.
14.Os irmãos Nietzsche mudar-se-iam
para Weimar, núcleo cultural central das musas da Alemanha, desde Goethe. É lá
que Nietzsche, que preferia ser visto como um bobo do que como um santo, um
homem que recusava frontalmente a possibilidade de o mundo ser reduzido a um
sistema, passará os últimos 3 anos da sua vida. Nietzsche, que procurou valor e
significado num universo incerto onde não existiam nem o ideal nem o divino
(p.437), terá o seu primeiro acidente vascular-cerebral em 1898 e o segundo no
Verão seguinte. Em 1900, após um resfriado, começou a ter dificuldades
respiratórias. Morreu a 5 de Agosto de 1900. Nietzsche comunicou que queria
descer à terra como um pagão e, quanto a música, pretendia apenas a sua versão
do "Hino à vida", de Lou. Nenhum ritual cristão, sobretudo nenhum
sacerdote.
Todavia, houve um longo serviço fúnebre
cristão em redor do caixão e a música foi de Brahms e Palestrina. Entre os
nietzscheanos inveterados, e apesar do horror de Nietzsche a discípulos, vão
contar-se num futuro próximo Hugo von Hofmannsthal, Stefan George Richard
Dehmel, Richard Strauss, Thomas Mann, Heinrich Mann, Martin Buber, Carl Jung,
Hermann Hesse, Paul Heyse, Reiner Maria Rilke, Max Brod, Albert Schweitzer,
André Gide, os bailarinos Vaslav Nijinsky e Isadora Duncan e o aviador Graf
Zeppelin. Mas também George Bernard Shaw e W.B.Yeats, H.G.Wells, James Joyce,
Wyndham Lewis, Herbert Read e T.S.Eliot. H.L Mencken terá sido o primeiro fã
dos americanos, seguido por Theodore Dreiser, Eugene O'Neill, Ezra Pound e Jack
London. Em França, Hippolyte Taine, Jean Bourdeau, André Gide, Paul Valéry,
Alfred Jarry e Eugène de Robert. Em Itália, Gabriele D'Annunzio e Benito
Mussolini (que foi o primeiro a compreender como podia adoptar as a filosofia
de Nietzsche às suas ideias pessoais de nacionalismo e violência).
No entender de Simon Blackburn,
“Nietzsche foi imbatível como o mais perspicaz e poderoso crítico do clima
moral do século XIX (e do que dele resta no nosso século). A sua investigação
sobre as motivações inconscientes antecipou Freud. Nietzsche destaca-se por ter
sublinhado «a vontade de poder» como o fundamento da natureza humana, o
«ressentimento» que surge quando lhe é negada a sua base activa” e “a
influência actual de Nietzsche parte não só da sua valorização da vontade, mas
sobretudo do seu cepticismo sobre as noções de facto e de verdade. Nietzsche
antecipou, em particular, muitas das doutrinas centrais do pós-modernismo: uma
atitude estética perante o mundo, na qual este é visto como um «texto»; a
negação dos factos; a negação das essências; a valorização da pluralidade de
interpretações e do eu fragmentado; e também uma desvalorização da razão e uma
politização do discurso. Todas estas doutrinas tiveram de esperar para serem
redescobertas no final do século XX.”. Para Giovanni Reale e Dario Antiseri,
Nietzsche caracterizou-se por ser um dessacralizador dos valores tradicionais,
se rebelar contra o facto (do positivismo), bem como face aos idealistas e a
sua ideia de progresso e possuir uma forte vontade provocadora. Consideram,
ademais, que é indiscutível “a sua influência, não só na literatura,
psicanálise, estética e filosofia, mas também na reflexão moral e na filosofia
da religião”. Na perspectiva de Bertrand Russell, Nietzsche, um “individualista
apaixonado, um crente no herói”, “procura combinar duas séries de valores que
não se harmonizam facilmente: de um lado, gosta da rudeza, da guerra e do
orgulho aristocrático; do outro, ama a filosofia, a literatura e as artes,
principalmente a música”, do mesmo passo que diz compreender comparações entre
Nietzsche e Maquiavel: “a filosofia política de Nietzsche é análoga à do
Príncipe”.
Houve uma interpretação (errada) em
chave belicista de categorias nietzscheanas estimuladas por artigos publicados
nos jornais por Elisabeth - alguém que era grande admiradora de Mussolini e que
chamaria a Hitler "uma personalidade tão maravilhosa (...) o nosso
magnífico chanceler"; encontraram-se em vida de Elisabeth e, a quando do
velório desta, Hitler marcou presença e deixou-se fotografar com expressão de
tristeza, o que era uma raridade; note-se, também, que em 1933, 300 professores
universitários assinaram uma declaração a apoiar Hitler - a incentivar tais
interpretações. 150 mil exemplares, de
edições de bolso, de obra de Nietzsche foram impressos para os soldados alemães
levarem para a Guerra 1914-1918), juntamente com Fausto de Goethe e o Novo Testamento. Isto quando Nietzsche era
declaradamente contra o militarismo pan-germânico, achava que havia muito
melhor forma de gastar os milhares de milhões que anualmente a Europa
depositava na guerra e, sobretudo, que era loucura colocar uma inteira
juventude à frente de canhões. O arquivo de Nietzsche iria ser enchido de
nacional-socialistas por parte de Elisabeth, que se revia no anti-semitismo
destes. Um outro editor, que distorceria em clave de darwinismo social, a
filosofia de Nietzsche seria Oswald Spengler. Heidegger seria, igualmente,
diretor do arquivo, com a peregrina ideia que mais importante do que os livros
de Nietzsche era o seu espólio literário, devidamente adulterado pela irmã
Elisabeth. É crença generalizada que Hitler, embora gostando de citar os
grandes nomes (e ainda que possuísse a bengala de Nietzsche que lhe fora
oferecida por Elisabeth), nunca terá estudado a obra de Nietzsche. Embora com
um título muito nietzscheano, “Triunfo da vontade”, o filme de Leni
Riefenstahl, em realidade, quando esta pergunta a Hitler se gostava de ler
Nietzsche, este responde: "Não, realmente não posso fazer muito com
Nietzsche...não é o meu guia" (p.443). Mas citações, usadas como slogans, sem qualquer compreensão dos
conceitos, de Nietzsche como de Kant, por exemplo, foram usadas para sustentar
o insustentável, por parte dos nazis. Sublinha Anthony Kenny: “ao longo do
século XX, Nietzsche teve uma enorme influência na Europa continental, em
particular na literatura russa e na filosofia alemã. A oposição que moveu à
moralidade submissa e ao socialismo democrático fizeram dele uma figura popular
entre os nazis, que julgavam estar a desenvolver uma raça de seres humanos
superiores. Terá sido em parte essa a razão que Nietzsche foi durante muito
tempo negligenciado pelos filósofos de língua inglesa: na segunda metade do
século XX, os filósofos éticos de tradição analítica chegaram à conclusão de
que o ataque violento que Nietzsche desferira à moral tradicional precisava de
ter resposta e não de ser ignorado” (pp.48-49). Na avaliação de Simon
Blackburn, “o Ubermensch [super-homem, homem superior] não é a «besta loura» do
fascismo posterior; é um ser humano que dominou as paixões, que se elevou acima
do fluxo sem sentido e que deu um estilo criativo ao seu carácter (…) mas
subsiste o facto inquietante de ele aparentemente não ter deixado quaisquer palavras
para condenar as bestas predadoras que mostram o seu melhor estilo ao exercerem
um poder, a todos os títulos repulsivo, sobre os outros.”
Nietzsche "descreveu o homem como
«o animal doente» porque tem tudo e, no entanto, está infectado com uma necessidade
insaciável do metafísico que nunca pode ser saciada" (p.445). Mas,
sobretudo, "a afirmação de Nietzsche «Deus morreu» dissera o indizível a
uma época que não desejava chegar ao ponto de reconhecer o óbvio: que sem
crença no divino já não havia qualquer autoridade moral para as leis que haviam
persistido ao longo da civilização construída durante os últimos dois mil anos”.
Que acontece quando o homem cancela o
código moral sobre o qual construiu o edifício da sua civilização? Que
significa ser um humano libertado das correntes de um objectivo central
metafísico? Ocorre um vazio de significado? Se assim for, o que irá preencher o
vazio? Se a vida que há de vir for abolida, o significado último reside no aqui
e agora"(p.445-446).
Primeiro, o homem tem de se tornar ele
próprio; depois, “amor fati”, tem de aceitar o que a vida traz; então o “Ubermensch”
estará em paz consigo e encontrará alegria na finalidade terrena e estará
conformado com a finitude da sua mortalidade ("quem tem o porquê da vida é
capaz de tolerar quase todos os como", p.461). Ainda que Nietzsche -
"a irracionalidade de uma coisa não é um argumento contra a sua
existência, mas sim a condição para que exista" - não dê propriamente
receitas ("não há factos, só interpretações"), nem uma resposta, um
dos seus factores de sedução. Exorta: "vive perigosamente! Constrói as
tuas cidades nas encostas do Vesúvio! (...). Queremos ser poetas das nossas
vidas - em primeiro lugar, nos assuntos quotidianos mais insignificantes (...).
Deveríamos seguir um caminho ousado e perigoso na nossa vida: aconteça o que
acontecer, vamos perdê-la"(p.461).
Em uma ponderação final da vida e obra
de Friedrich Nietzsche, Anthony Kenny realça que “é difícil tecer um juízo
crítico sobre a ética de Nietzsche, dado que os seus escritos são amiúde
deliberadamente caóticos, e não surpreende que as interpretações e avaliações
académicas sejam muitíssimo variadas. Por exemplo, não é fácil perceber a
posição de Nietzsche sobre a questão do valor moral da crueldade. Quando denunciou
o papel desempenhado pela culpa na moral do escravo, Nietzsche descreveu com
eloquente indignação as torturas infligidas por opressores hipócritas. Mas foi
complacente com os excessos das suas «bestas louras» aristocráticas, excessos
esses que «talvez se devam a um acesso hediondo de assassínio, fogo posto,
violação e tortura, um acesso fanfarrão e moralmente equânime, equiparável a
uma partida de estudantes descontrolada».
Nietzsche foi, sem dúvida, um
entusiasta no que dizia respeito à guerra. «Renunciar à guerra», escreveu,
«significa renunciar à vida maior». A guerra proporciona uma educação em
liberdade e a liberdade significa que os instintos viris que se deleitam na
vitória triunfam sobre outros instintos, incluindo o desejo de felicidade. (…) Em certas circunstâncias específicas, o
suicídio também inspira admiração a Nietzsche. Os médicos devem recordar aos
seus doentes que são parasitas da sociedade e que há uma altura a partir da
qual deixa de ser de bom-tom continuar a viver”. Em suma, e como que
respondendo à indicação de Grayling (ou Russell) de que as grandes preocupações
e indagações de Nietzsche eram de ordem ética, interroga(-se): “Poder-se-á
considerar Nietzsche um eticista? Será ele um moralista genuíno, com teses
muito pouco ortodoxas sobre virtude e vício? Ou uma pessoa completamente
amoral, sem qualquer interesse no certo e no errado? Por um lado, Nietzsche
opera claramente no mesmo domínio em que pensaram alguns grandes moralistas do
passado: o seu ideal de ser humano tem semelhanças com o homem de «grandeza de
alma» da Ética a Nicómaco de Aristóteles. Por outro lado, Nietzsche professa
estar não só a apresentar perspectivas originais sobre o bem e o mal, mas a
transcender por completo essas categorias. Nietzsche diz-se imoralista, afirma
que não há factos morais e faz o seu melhor para desvalorizar dois dos
conceitos fundamentais da maioria dos sistemas morais – o de justiça e o de
culpa. Penso que a resposta consiste em reconhecer que Nietzsche partilha com a
moral tradicional uma preocupação última com a progressão do ser humano e que a
razão por que condena muitas virtudes convencionais reside precisamente em
acreditar que elas impedem que se atinja uma vida digna de ser vivida, ao invés
de contribuírem para esse fim. Todavia, na sua preferência pelo maior em
detrimento do bom e pelo homem nobre em detrimento do homem bom, revela ter um
critério fundamentalmente estético, e não ético, de vida recta. O homem ideal
de Nietzsche não só não ama o próximo como, em bom rigor, não tem próximo.”
(pp.263-264).
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