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A mostrar mensagens de fevereiro, 2023

ACELERADOR DE CURIOSIDADE (JORGE CALADO)

  ACELERADOR DE CURIOSIDADE 1.Embora não sendo o maior dos amantes de fado, tinha em “Barco Negro”, cantado por Amália Rodrigues , o meu favorito. Fico, agora, a saber, através da leitura de “Mocidade Portuguesa” ( Imprensa Nacional , 2022), de Jorge Calado , que a canção fora introduzida em Portugal por Maria da Conceição, embora sob outro título (“Mãe preta”) e letra diversa (centrada na denúncia do esclavagismo). Prossegui, curioso, o novelo da música e percebi que, originalmente, “Mãe Negra” foi composta por dois poetas brasileiros, Caco Velho ( Matheus Nunes ) e Piratini ( António Amábile ), em 1938, tendo sido estreada, do outro lado do Atlântico, pelo “Conjunto Tocantins”, em 1943. Uma canção sertaneja, transposta para fado na década de 50, com a censura, no nosso país, a não permitir que a letra original permanecesse (com a existência de colónias, durante esse lapso de tempo), acabando por dar origem a “Barco Negro”, letra de David Mourão-Ferreira na voz de Amália (desde l

A BELEZA DE PREFERIR FICAR

  No reparo do dia de hoje, na universidadefm, o João Gonçalves e o Carnaval em Paradela do Monte À beira de completar o mestrado em Engenharia Informática na Universidade do Minho depois de concluir a licenciatura na UTAD, João Gonçalves dirige, com um brilhozinho nos olhos, a Associação Desportiva e Cultural de Paradela do Monte, lugar situado na freguesia de Louredo, no concelho de Santa Marta de Penaguião. Três anos depois de, após o imediato emergir, no nosso país, da pandemia da covid19, se ter voluntariado e recebido acções de formação para participar em iniciativas que visavam salvar vidas, desde logo aos mais velhos do nosso concelho; após ser vice-presidente do núcleo de estudantes do seu curso; tendo tido todo um percurso escolar/académico sem falhas e repleto de boas notas e brilhantismo; sendo um dos mais talentosos e dedicados estudantes que conheci – foi sempre de querer, paciente e disciplinadamente, compreender os manuais ou as sebentas, consigo nunca o despejar, d

'MEMÓRIAS EM TEMPO DE AMNÉSIA' (ÁLVARO DE VASCONCELOS)

  “ Memórias em tempo de Amnésia. Uma campa em África ”, de Álvaro Vasconcelos   1.Moçambique, Beira, 1960, casa de colonos portugueses (brancos): um criado negro deixa cair um copo, que se parte. A patroa envia-o à esquadra com um bilhetinho: as pancadas, como cominação da negligência do empregado, devem ser aplicadas nos pés, para aquele poder voltar rapidamente para casa em condições de, no imediato, prosseguir labuta. Poucos anos antes, na mesma Beira, seria Álvaro ainda uma criança, entra (o menino) em casa esbaforido: acabara de assistir ao espancamento de um negro, por meia dúzia de brancos, apenas por aquele ter respondido aos insultos que sofrera (o simples tratamento por tu podia dar lugar a castigo físico, naqueles tempos e lugares do império, assinalara Dulce Maria Cardoso ). Esmagado, conta ao pai o que acabara de presenciar – e este, pressentimos um encolher de ombros, é assim que a vida é, nada há a fazer, adiante -, a convicção humanista ter-lhe-á ficado, sem fissura

ILHA DENSA DO HUMANO

  ILHA DENSA DO HUMANO (" OS ESPÍRITOS DE INISHERIN ") “Há coisas que são insuperáveis e ainda bem”, atira Pádraic , no diálogo último do filme, até parece – um reatar de – uma conversa normal, com Colm Doherty , depois de este último ter posto fim à vida do seu pequeno burro e, em revanche, aquele incendiar a casa de Colm. Fica sem um contorno claro se o que não se consegue superar é uma amizade profunda – que Doherty, em vista de um projecto de conceber uma música definitiva que o legue à posterioridade pretende, acabando com as conversas “chatas” do “aborrecido” Pádraic, passando esse tempo a dedicar-se à arte - ou se a inimizade entretanto vindoura – que desagua numa casa lançada em chamas. Pádraic afirma lamentar que Doherty não se tivesse mantido em casa durante o incêndio: se o “amigo é metade da minha alma”, que parte de si pretenderia assassinar (suicidar)? Sendo a amizade profunda, e de longos anos, ainda que o projeto de da morte se libertar por obras valorosas sej

CONTORNOS E AMBIGUIDADES DE UMA ERA SECULAR (I) (CHARLES TAYLOR)

  contornos e ambiguidades de uma era secular De que tonalidades se faz um tempo? Não se furtará este a delimitadas fronteiras que procuram captá-lo (capturá-lo) com absoluta nitidez? E não avançamos, nós, também, para ele, para o tempo (furtivo), com categorias e esquemas rígidos de classificação (pré-formatados)? De resto, estaremos nós, habitantes deste tempo, em condições bastantes para o cartografar, seja porque gostaríamos de nos afastar para que a sua imagem refulgisse com insuperável transparência (e contingente é a nossa condição), seja porque procedemos a comparações que implicam colocarmo-nos em tempos remotos, épocas nas quais nos adentramos, necessariamente, com certa timidez, prudência e cautela? E será, este, ainda, um tempo uniforme, ou, como raramente sucedeu em universos menos interdependentes, temos a exata noção de como vivemos, à escala global, tempos diferentes, penetrados por colorações de sentido divergente?             A demanda de esboçar um acervo de refe